29.9.05

BOM DIA


Annabel Gosling Posted by Picasa

Amigo

Mal nos conhecemos
Inaugurámos a palavra «amigo».

«Amigo» é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!

«Amigo» (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de inimigo!
«Amigo» é o erro corrigido,

Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada.

«Amigo» é a solidão derrotada!

«Amigo» é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
«Amigo» vai ser, é já uma grande festa!

Redacção

Uma senhora pediu-me
um poema de amor.

Não de amor por ela,
mas «de amor, de amor».

À parte aquelas
trivialidades «minha rosa, lua do meu céu interior»
que podia eu dizer
para ela, a não destinatária,
que não fosse por ela?

Sem objecto, o poema
é uma redacção
dos 100 Modelos
de Cartas de Amor.

Alexandre O´Neill

28.9.05

Boa Tarde

















Annabel Gosling

O Raul Leal era...

O Raul Leal era
O único verdadeiro doido do "Orpheu".
Ninguém lhe invejasse aquela luxúria de fera?
Invejava-a eu.

Três fortunas gastou, outras três deu
Ao que da vida não se espera
E à que na morte recebeu.
O Raul Leal era
O único não-heterónimo meu.

Eu nos Jerónimos ele na vala comum
Que lhe vestiu o nome e o disfarce
(Dizem que está em Benfica) ambos somos um
Dos extremos do mal a continuar-se.

Não deixou versos? Deixei-os eu,
Infelizmente, a quem mos deu.
O Almada? O Santa-Ritta? O Amadeo?
Tretas da arte e da era. O Raul era
Orpheu.

Mário Cesariny

26.9.05


André Derain Posted by Picasa

A economia nacional fragilizada...

Porque razão se tecem loas, tantas e tão diversas, a um leque de gestores de empresas nacionais participadas pelo Estado (não inclúo aqui o CEO da TAP que tem feito, indiscutivelmente, um bom trabalho) e depois verificamos que todas elas, as empresas participadas pelo Estado, são opáveis (sujeitas a OPAS hostis), começando pela PT, a mais opável de todas?
E se a PT cai em mãos espanholas? E a EDP? E a GALP?
Porque razão foram todas elas geridas na óptica dos accionistas e nunca na óptica dos interesses nacionais?
A resposta é simples e a pergunta de retórica: por interesses claros dos accionistas privados e por interesses calados dos gestores das comissões executivas!

CENÁRIOS PRESIDENCIAIS

É curioso verificar o espectro de candidatos à esquerda do centro (assim, tal e qual, sem sentido nenhum e totalmente redundante como toda a nossa política, partidos políticos e demais agentes), cinco a saber: Soares, Alegre, Jerónimo, Louçã, o inefável Garcia Pereira que estará garantidamente presente.

Ao centro não conto nenhum, aquele centro que decide sempre as eleições, ao género dos enjeitadinhos que têm de se decidir e, na ausência de causas próprias, acabam por apadrinhar as causas dos outros, umas vezes caindo para um lado, outras para outro. Nunca, e aqui é que me ressinto, por análise directa e objectiva dos programas eleitorais propostos, tampouco por promessas que todos sabem de há muito tratarem-se de folclore eleitoral, mas tão sómente por inexistência de opções credíveis - aqueles não prestam, os outros também não, vamos lá votar nestes agora para ver no que é que dá!, mas a continuar na mesma para a próxima já não voto!

Assim se vai construindo a partidocracia portuguesa, cada ano que passa mais sedimentada na abstenção. Já sei o que estão a pensar: não é só aqui.
Pois não. Com excepção do R. Unido, todos os outros são iguais, sendo impossível descortinar diferenças. Haverá alguma razão válida ou sómente lógica para que um cidadão alemão, holandês ou francês se sinta mais motivado para votar que um português? Claro que não. A partidocracia é igual em toda a parte, endémica, com o centro viral situado em Bruxelas.

Continuando.
À direita do dito centro (cada vez faz menos sentido falar em direita, esquerda e, por maioria de razão centro. Mas com candidatos formados em escolas políticas vetustas, esta é a nomenclatura possível no momento, sob pena de a ser adoptada outra, ninguém a entender), também não vejo ninguém. Ouço falar mas não vejo. Cavaco Silva é o nome mais falado. Zunzuns de Santana, e agora de Portas, abrem uma nesga de espectativa sobre o possível aparecimento de um segundo.

Analisemos à luz dos factos, dos tabús e dos zunzuns os cenários possíveis. Divido estes em dois:

1º - Cavaco avança sózinho no centro-direita. As sondagens de opinião apontam para uma possível vitória logo à primeira. Alegre desiste a favôr de Soares - deixou essa possibilidade em aberto quando anunciou a candidatura, ao referir o desinteresse da mesma caso se perspectivasse, mesmo assim, uma vitória de Cavaco na 1ª volta - Jerónimo faz o mesmo e Louçã acompanha-o - a candidatura de Louçã só faz sentido enquanto se mantiver a do PC.

Uma possível segunda volta entre Cavaco e Soares fica quase traçada.

O mercado das sondagens aponta para a inevitabilidade de uma segunda volta. Alegre mantém a candidatura, Soares idém, Jerónimo desiste ou não a favôr da esquerda, o mesmo passando-se com Louçã. Segunda volta Cavaco vs Soares. Mesmo assim tanto PC como Bloco decidem não arriscar e aconselham o voto na esquerda, o mesmo é dizer Alegre. Alegre capitaliza mais votos e reconhecimento político, dependendo do sentido de voto dos militantes do PS, para se bater ou não com Cavaco à segunda.

2º cenário - aparecem dois candidatos no centro-direita. A esquerda vai toda a votos e, pela possível dispersão de votos que tanto candidato de esquerda implica, passam os dois candidatos do centro-direita à segunda volta.

A esquerda, receosa, une os seus esforços em torno de Soares e Alegre e, uma vez mais, será o eleitorado do centro e do PS a decidir qual dos candidatos de esquerda passa à segunda volta.

Num caso e noutro Manuel Alegre, políticamente, capitaliza sempre. A face mais visível do grupo de Argel sai reforçado e, inclusivé, Alegre tem alguma probabilidade de ser eleito. Não é grande, mas tem.

Por mim vos digo: vai-me faltando a paciência para este Portugal, que já nem está em pára-arranca.

Parou mesmo, de vez! Quem anda nestas coisas dos números sabe que o futuro próximo é um túnel sem fim à vista, sem luz nem nada.

O nosso País parou até no tempo e no discurso, nas ideias e na vontade. Pára conforme morre o interior e a urbe, desorganizada e escanzelada, vai matando por inacção aqueles que aí habitam e que para lá se deslocalizam.

As Presidenciais não vão alterar nada a situação e os candidatos não são famosos (hoje estou simpático). Será mesmo só uma questão de brio e orgulho de ser português. Mas será que algum, dos até agora apresentados, responde cabalmente a este desígnio tão pequeno? Não! Claramente não.

Mas como o actual também já não corresponde ao perfil, temos obrigação de já estar habituados.



22.9.05
















Henri Rousseau

QUESTÕES DE BERÇO

José Pacheco Pereira defende hoje no Público, em crónica bem escrita e arquitectada como é seu timbre, que o ênfase da escolha entre Soares e Cavaco, nas Presidenciais, não pode ser colocada ao nível da sofisticação cultural e social dos candidatos. Reconhece que nesse campo Soares leva enorme vantagem, pelas origens, pelo berço, mas que tal reconhecimento ou intuição desse facto, por parte dos eleitores, não deverá ser condicionador da escolha. Concordamos igualmente que não, que as oportunidades devam ser iguais independentemente das origens. Já o escrevemos, acrescentando que a igualização só é conseguida através de um enorme esforço por parte de quem sai em desigualdade social. Mas é possível!
Não o cremos que tenha sido conseguido por parte de Aníbal Cavaco Silva, que em condições de igualdade social quando comparado com Soares, não teria certamente baptizado de Mariani uma vivenda de que era proprietário em Montechoro.

Como é igualmente verdade que quando ouvimos Marques Mendes, líder da principal força política na oposição, de quem se espera competência, rigor e cultura, dirigir-se uma vez a Judite de Sousa, em princípio de frase por, "Você sabe...."; e numa segunda oportunidade ( e aqui acabou-se-me a paciência para o ouvir) lhe diga - "Ainda bem que me colocou essa questão Ó Judite!", ficamos imediatamente elucidados quanto à fluência, cultura e domínio da nossa lingua, bem como em relação ao meio onde viveu, cresceu, se inseríu e frequenta.
O Ó, como sabemos é desnecessário e baixo, bem como o Você demasiado popularucho e abrasileirado.
Mas Marques Mendes também padece dos mesmos tiques que Cavaco tendo, além desta, outra característica comum: são de origem humilde e não se impuseram uma disciplina de aprendizagem férrea.
Não ouvi o final da entrevista, como já referi, mas se Judite de Sousa acabasse agradecendo a presença de Marques Mendes dizendo-lhe: "Agradeço a sua presença nesta Grande Entrevista Sr. Luís,", creio que Marques Mendes nem notaria e acharia perfeitamente normal o tratamento.
Por isso digo: faz diferença o meio onde se nasce e cresce, a aprendizagem percebida, o esforço pessoal na evolução constante, tendo como modelo o melhor dos outros, descobrindo o melhor de nós próprios.
p.s. nunca votei Soares e não vou começar agora.

As Palavras Interditas dos Leitores

CUÉNTAMELO OTRA VEZ

«Cuéntamelo otra vez: es tan hermoso que no me canso nunca de escucharlo. Repíteme otra vez que la pareja del cuento fue feliz hasta la muerte, que ella no le fue infiel, que a él ni siquierase le ocurrió engañarla. Y no te olvides de que, a pesar del tiempo y los problemas, se seguían besando cada noche. Cuéntamelo mil veces, por favor. Es la historia más bella que conozco».

Amalia Bautista

BlahBlahBlah

20.9.05


Francis Picabia Posted by Picasa
Cansei-me de tentar o teu segredo:
No teu olhar sem cor, - frio escalpelo,
O meu olhar quebrei, a debatê-lo,
Como a onda na crista dum rochedo.

Segredo dessa alma e meu degredo
E minha obsessão! Para bebê-lo
Fui teu lábio oscular, num pesadelo,
Por noites de pavor, cheio de medo.

E o meu ósculo ardente, alucinado,
Esfriou sobre mármore correcto
Desse entreaberto lábio gelado:

Desse lábio de mármore, discreto,
Severo como um túmulo fechado,
Sereno como um pélago quieto.

Camilo Pessanha

PROPOSTA DE INVESTIGAÇÃO

Seria interessante determinar, ainda em nome da clarificação da necessidade de construção de um aeroporto na Ota, quem detém a propriedade dos terrenos onde se pretende construir o aeroporto, bem como quem detém a propriedade dos terrenos circundantes, normalmente utilizados para a instalação de serviços correlacionados com os aeroportos, como hóteis, restaurantes, etc..

As Palavras Interditas dos Leitores

Bem como a data de aquisição e a classificação dos terrenos, pelo menos um a dois anos antes da aquisição.
Pertinente.
A bem da transparência!

António Stein

Questões de gaguez ministerial...

Em declarações prestadas já esta manhã o Ministro das Finanças, gaguejando mais do que o habitual (não porque seja gago mas porque as perguntas são incómodas), acabou dizendo por outras palavras aquilo que se sabe há muito, muito tempo: o investimento e a criação de empregos no sector privado não se promovem por decreto. Ou seja, o Governo nada pode fazer para inverter o ciclo de increteza e desilusão que se abateu sobre a economia portuguesa.

As Palavras Interditas dos Leitores

O Vitor Constancio também gaguejou.
Quem é que já não gagueja? Será falta de ar? Ou "O", já não saber que dizer?
A rendição "Final" aos factos, está para breve.
Mas é a "Verdade", Infelizmente!
Resta saber se há cura possível para tamanha "Ferida".

António Stein

Questão de Chapéus...

O General Loureiro dos Santos dá uma no cravo e outra na ferradura.
Vivendo do regime, melhor do que os seus colegas de armas de igual patente, gozando do benefício de ser um porta-voz oficioso para assuntos militares e de estratégia da 3ª República, mas integrado na Instituição castrense, o pobre General perde-se em redundâncias e em tempos mortos, entre o põe e tira o chapéu.

19.9.05

(I can´t get no) SATISFACTION

Porque quem canta seus males espanta... porque a leitura política se mantém actual e, igualmente, porque o tempo para escrever não tem sido muito.....

I can't get no satisfaction, I can't get no satisfaction
'Cause I try and I try and I try, try, try and I try
I can't get no, I can't get no

When I'm drivin' in my car, and the man come on the radio
He's tellin' me more and more, about some useless information
Supposed to fire my imagination

I can't get no. Oh, no, no, no. Hey, hey, hey
That's what I say
I can't get no satisfaction, I can't get no satisfaction
'Cause I try and I try and I try, try, try and I try
I can't get no, I can't get no

When I'm watchin' my TV and a man comes on and tell me
How white my shirts can be
But, he can't be a man 'cause he doesn't smoke
The same cigarettes as me

I can't get no. Oh, no, no, no. Hey, hey, hey
That's what I say
I can't get no satisfaction, I can't get no satisfaction
'Cause I try and I try and I try, try, try and I try
I can't get no, I can't get no

When I'm ridin' round the world
And I'm doin' this and I'm signin' that
And I'm tryin' to make some girl, who tells me
Baby, better come back maybe next week
'Cause you see I'm on a losing streak
I can't get no. Oh, no, no, no. Hey, hey, hey
That's what I say. I can't get no, I can't get no
I can't get no satisfaction, no satisfaction
No satisfaction, no satisfaction

(Mick Jagger)

15.9.05
























Giorgio de Chirico

RAZÕES DA MEDIOCRIDADE

Citando Fayga Ostrower:

«A natureza criativa do homem nasce do contexto cultural onde se encontra inserido. Todo o indivíduo cresce e desenvolve-se numa determinada realidade social, cujas necessidades e valorizações culturais se moldam aos próprios valores de vida. No indivíduo confrontam‑se, por assim dizer, dois pólos de uma mesma relação: a sua criatividade, que representa as potencialidades de um ser único, e a sua criação, que será a realização dessas potencialidades já dentro do quadro de determinada cultura embebida»

Citando Miguel Torga:

«Moeu‑me a paciência! Trinta anos, bem medidos, de tenacidade! Cheguei quase a desanimar. Vinha, olhava, tornava a olhar, e nada. Alcandorado no seu trono de penedos e nuvens, com o Douro ajoelhado aos pés e o céu a servir‑lhe de resplendor, o Santo furtava‑se ao retrato poético, de qualquer ângulo que eu apontasse a objectiva. Hoje, porém, de repente, entre duas perdizes, não sei por que carga de água, abriu o rosto e foi ele mesmo que me propôs o instantâneo. / ‑ Mostre lá então as habilidades... ‑ pareceu‑me ouvi‑lo dizer. / Nem escolhi enquadramento. Antes que se arrependesse, travei a espingarda e disparei a imaginação ao calhar, do sítio onde estava. / Na arte fotográfica propriamente dita, à sístole diafragmática segue‑se a revelação da película na câmara escura, rematada por alguns retoques amáveis às imperfeições da obra. No meu caso, não houve película, nem câmara escura, nem retoque nenhum. A imagem saiu como está do acto retentivo. Parecida com o original? Muito longe disso. Os poetas não trasladam feições».

Citando Fayga Ostrower:

«Todo o processo de elaboração e de desenvolvimento abrange um processo dinâmico de transformação, em que a matéria que orienta a acção criativa é transformada pela mesma acção. [...] Transformando‑se, a matéria não é destituída do seu carácter. Pelo contrário, é diferenciada e, ao mesmo tempo, é definida como um modo de ser. Transformando‑se e adquirindo uma nova forma, a matéria adquire unicidade e é reafirmada na sua essência. Ela torna-se matéria configurada, matéria‑forma, e nessa síntese entre o geral e o único é impregnada de significados»

António Ferreira, a Diogo Bernardes, aconselha o amigo:

Não mude ou tire ou ponha, sem primeiro
Vir aos ouvidos do prudente, experto
Amigo, não invejoso ou lisonjeiro.

[...] Per'isto, é bom remédio às vezes ler‑se
A dous ou três amigos; o bom pejo
Honesto ajuda então a melhor ver‑se.

Vitorino Nemésio, no poema «O Bicho Harmonioso» escreve:

Eu gostava de ter um alto destino de poeta,
[...]
Tudo isto seria aquele poeta que não sou,

Feito graça e memória,
Separado de mim e do meu bafo individualmente podre,
Livre das minhas pretensões e desta noite carcomida
Pelo meu ser voraz que se explora e ilumina.

A capacidade que cada um detêm para se afirmar, internamente, com maior ou menor grau de exigência nas suas acções, atribuindo-se satisfação ou pelo contrário criticar-se duramente e nunca ficando satisfeito com a obra realizada advém, com naturalidade, da dualidade surgida da aprendizagem feita da vida vivida com as impressões decalcadas do meio social e cultural onde cresceu e se moldou.

Não significa, forçosamente, que a condicionante social e cultural não possa ver-se melhorada e acrescida quando o indivíduo possui forte espírito crítico e enorme inteligência. A cultura espelhada é o reflexo da imagem das alegrias e frustrações apreendidas e da capacidade interpretativa das mesmas. Se o homem nasce e cresce rodeado de sentimentos pequenos e mesquinhos dificilmente o deixará de ser. O reflexo que projecta é, em grande parte, fruto dos reflexos colhidos de todos os outros com quem privou, que escutou e com os quais concordou ou discordou.

A própria essência do acto de concordar ou discordar é relativa e fortemente condicionada pelo espírito crítico, pela inteligência, capacidade de análise e cultura assimilada, tudo vertentes de um mesmo sólido: a aprendizagem efectuada e constantemente aumentada e reciclada. Estando a aprendizagem inteiramente dependente da transmissão oral e escrita, falhando em parte ou no todo aquela resta a leitura compulsiva e multifacetada para suprir as lacunas do conhecimento. Ficam contudo de fora as acções comportamentais associadas ao meio social onde cresceu e os valores retidos, estes normalmente incutidos pelo processo de transferência familiar.

Não é assim indiferente para a transformação da matéria todo o conjunto de significados apreendidos pelo indivíduo, influindo directamente na maneira de ser e no carácter deste. O maior ou menor grau de exigência que fixamos para nós próprios reflecte-se, directamente, na menor ou maior satisfação que retiramos dos nossos actos e na nossa própria realização. É a diferença entre acertar a bitola por cima ou preferir comparar por baixo.

É então claro que quanto maior o grau de compreensão dos fenómenos, maior o grau de exigência nos comportamentos e acções. Tendencialmente procuraremos os melhores e, ainda assim, viveremos confrontados com a realidade de que o que fazemos, todo o processo criativo fundido no geral e no particular, poderia ser ainda melhor e essa constatação e insatisfação simultânea leva a uma transmissão social e cultural cuidada e atenta, na esperança de que quem nos escuta e nos precede consiga fazer melhor.

Infelizmente para o Portugal político o conhecimento, a exigência individual e a consciência do colectivo foi vencido pela mediocridade no geral. Na mediocridade não há lugar para vozes discordantes só havendo mesmo lugar para os medíocres e os muito medíocres, porque a comparação se faz por baixo. O padrão não comporta significados nem carácter. A essência da coisa reside nos tiques pequeno-burgueses, adicionados a uma forte dose de impreparação cultural, ausência de postura e desconhecimento das regras de comportamento social.

É por culpa do homem político nacional que o País está como está: sem identidade, sem valores, sem história, sem cultura, sem educação. Em suma, sem sentido.

13.9.05

A MANIFESTAÇÃO POPULAR QUE FALTA

Os militares aguardaram pacientemente pelo doutíssimo (sem ponta de ironia) parecer do Tribunal Administrativo de Lisboa para conhecerem o destino da manifestação agendada para hoje terça-feira 13 de Setembro, depois de a terem visto recusada pelo Governo Civil e pelo Governo. Acataram as indicações do tribunal e reuniram-se em local privado.

Não se contesta o facto e até se concorda em absoluto que as forças militares e militarizadas não gozem dos mesmos direitos reivindicativos, na forma que não no conteúdo, da população civil. Os deveres são diferentes, as responsabilidades também. Um funcionário público ou um qualquer trabalhador por conta de outrém não jura bandeira quando inicia o exercício das suas funções.
O juramento de Bandeira implica um comprometimento perante a Nação e a Nação não se discute. Somos mesmo contra a existência de sindicatos nas forças militarizadas e igualmente contra as manifestações que têm sido levadas a cabo. Contudo importa destacar que a importância e imagem para o País da PSP é uma e a imagem das Forças Armadas é outra, com um claro peso de responsabilidade e reconhecimento da população a recair sobre esta última.
As Forças Armadas são o último bastião da Pátria.

Não se compreende, contudo, que devendo as Forças Armadas assumir um papel de recato nas suas reivindicações usando para o efeito os canais competentes, Estados-Maiores, para fazer chegar aos ouvidos da classe política dirigente as suas necessidades, mal-estares e anseios, que idêntico procedimento não tenha sido seguido em 1973 e 1974.

Ademais, encontrando-se o País em guerra com movimentos terroristas no Ultramar e sabendo-se como as situações de conflito armado servem às mil maravilhas para a progressão rápida nas carreiras militares, menos se compreende que os militares de carreira de então tenham preferido reivindicar pelas armas, através de um golpe de estado e ferindo de morte o juramento de bandeira que todos tinham proferido, uma questão de vencimentos e progressão nas carreiras quando se sentiram tapados e em pé de igualdade com os oficiais milicianos e não através do diálogo com o poder ou mesmo, tratando-se de situaçao insanável, requerido autorização para se manifestarem públicamente.

O resultado teria sido o mesmo; a proibição, mas todos nós teríamos tido oportunidade de perceber como se iria comportar o 3º Plano de Fomento, que tão boa conta de si deu no início, em 1973 quando eclodíu a crise do petróleo, colocando Portugal a crescer a 7,3% ao ano, contra cerca de 3% da restante Europa e isto sem quaisquer fundos vindos de Bruxelas.

Por via dessa imensa reivindicação salarial conhecida como 25 de Abril, ficámos todos mais pobres. Entregues à Europa, mais concretamente a Espanha, entregues a forças políticas minadas por políticos viciados na sedução do poder, na sua maioria impreparados para o exercício de cargos públicos pela incapacidade que demonstraram, durante trinta anos, em separar o interesse nacional dos interesses particulares e, verificamos agora também, a Forças Armadas a quem retiraram a sua única capacidade reivindicativa, a revolução, mostrando a classe política ter aprendido com a 1ª República ao diminuir militar e socialmente a sociedade castrense.
Não se infira destas palavras qualquer defesa de uma nova revolução assinada pelos militares portugueses. Contudo, tampouco se pode fazer orelhas moucas às súplicas constantes coincidentes num único sentido: a incapacidade do povo português de se fazer ouvir e dizer basta a tanta pouca vergonha, a um tão grande delapidar do património nacional, da sua economia e da crescente degradação das condições de vida nos planos económico e social.
Se os militares estão proibidos e bem de se manifestarem, tal proibição não é aplicável ao comum do cidadão.
Que venha então todo o povo para a rua, sem excepção, gritar bem alto a sua indignação pela condução da vida política e conómica do País aos gritos de VIVA PORTUGAL!

As Palavras Interditas dos Leitores

os fantasmas já não são fantasmas, antes e muito, corpos visiveis que tentam arrastar-nos para lÁ DO MAR, e com um pouco de sorte talvez cheguemos ao país da frontalidade...mas somos muitos azarentos, não é?

Mendes Ferreira

12.9.05

As Palavras Interditas dos Leitores

E o nosso maior receio é que, com a falta de soluções, a radicalização da sociedade comece a ganhar forma com contornos assustadores.
Começa a ser preocupante percebermos que não temos um Maestro capaz de dirigir uma orquestra que não atina com o andamento! Não fosse a situação Geopolítica, não estaríamos longe de uma Sul Americanização.Qual Sebastião, Qual Caudilho.
Os Fantasmas andam por aí!!!

Antonio Stein

9.9.05

RAZÃO DA REDUNDÂNCIA DA CRÍTICA POLÍTICA

A grande questão não reside na crítica política e económica constante, protagonizada à vez pela oposição aos governos PSD e PS que se sucedem. A grande questão, a enorme questão reside no facto de uns e outros não terem soluções para os problemas económicos e sociais do País, porque o País de tão mal orientado nas últimas décadas não apresenta saídas possíveis.

As economias, todas elas, necessitam de gozar de proteccionismos de peso maior ou menor, consoante a sua pujança económica, a inserção geográfica, o grau de desenvolvimento e o momento temporal considerado. Se assim não fosse não haveria razão para preocupações com os textéis chineses nem teria havido motivos válidos para a última cimeira entre China e UE nesta matéria.
Se se considera o princípio válido para regiões geográficas económicas diferentes, terá de se encarar como igualmente válido para países diferentes dentro de uma mesma região geográfica económica. A economia portuguesa não sofre das mesmas idiossincrasias nem apresenta os mesmos atributos que a economia francesa, como esta não se assemelha à economia alemã.
Tratar todos por igual só pode conduzir ao acentuar das diferenças, ao aumento das desigualdades, favorecendo os mais fortes e enfraquecendo, progressivamente, a capacidade de resposta dos mais fracos.

Portugal tem enfraquecido progressivamente ao longo dos anos, com pouco para oferecer se exceptuarmos a demagogia. O problema é estrutural pelo que, hoje por hoje, é igual ser o PS ou PSD a governar: são igualmente impotentes para travar o descalabro e, em economia, não existe D. Sebastião que nos valha.

[Nº 33] THE HOUSE OF BLUES

MUDDY WATERS

Baby, please don't go
Baby, please don't go
Baby, please don't go,
down to New Orleans
You know I love you so

Before I be your dog
Before I be your dog
Before I be your dog
I get you way'd out here, and let you walk alone

Turn your lamp down low
Turn your lamp down low
Turn your lamp down low
I beg you all night long, baby, please don't go

You brought me way down here
You brought me way down here
You brought me way down here
'bout to Rolling Forks, you treat me like a dog

Baby, please don't go
Baby, please don't go
Baby, please don't go, back the New Orleans
I beg you all night long

Before I be your dog
Before I be your dog
Before I be your dog
I get you way'd out here, and let you walk alone

You know your man down gone
You know your man down gone
You know your man down gone
To the country farm, with all the shackles on

8.9.05

IMBECILIDADES

A propósito de José Diogo Madeira e um seu artigo no Jornal de Negócios e porque quase tudo o que os articulistas nos impingem é mau e, igualmente, porque por vezes não apetece comer e calar, refere-se ao citado senhor que os Estados Unidos da América não são um País porque são uma Confederação de Estados e porque se fossem um País em português seria é e não são!

Igualmente se ilustra a capacidade de resposta rápida e eficiente a todo e qualquer desgraçado e funesto acontecimento que aconteça em território americano, bem como a disponibilidade para ajudar terceiros quando estes necessitam. Belíssimo exemplo encontramos no Plano Marshall e na preciosa contribuição americana no esforço europeu do pós-guerra ou a mais recente intervenção no Iraque, com elevados custos humanos e materiais, que possibilitou a aproximação entre judeus e palestinianos, a desocupação militar do Líbano e um aliviar de tensões na zona do Golfo Pérsico.

Confundir os EUA com o terceiro-mundo é igual a confundir a História com a Geografia.

Por último e porque imbecilidades não nos devem tomar mais do que o tempo necessário para as denunciar, acrescento que caso Diogo Madeira fosse cidadão americano ou lá trabalhasse certamente não seria articulista num jornal de negócios, tão fraca é a prosa e tão lerdo o pensamento, mas caso o fosse (sendo necessáriamente alguém diferente), teria muito que comentar sobre negócios e empresas não necessitando de recorrer à política baixa e barata.

7.9.05

cabeças políticas complicadas....


Santa-Rita Posted by Picasa

A (MÁ) POLÍTICA DO POSSÍVEL...

Toda a propaganda que inunda as nossas maiores cidades na procura do voto autárquico é, na sua maioria, patética. Os slogans repetem-se ao ritmo das promessas vetustas, todas bem acompanhadas por sinais claros de ausência de qualquer planificação urbanística numa ilustração cabal da ausência de respeito para com as populações. A falta de respeito marca fortemente a actuação autárquica nacional, quer falemos do governo central quer falemos das Camaras Municipais. Os raros exemplos de cuidado urbanístico surgem nalgumas localidades no Alentejo, no Minho e em Castelo Branco. Todo o restante País é o espelho desgraçado da bandalheira política a que, forçados, nos temos habituado a suportar nos últimos vinte anos.

Longe vão os tempos da discussão política acesa, dos disparates políticos mas igualmente da crença depositada no novo regime. Hoje os políticos estão desacreditados, a discussão política é insípida e vazia de conteúdo, feita de aproveitamentos de circunstância nos temas escolhidos, muito dirigida para a árvore e longe da capacidade de visão do global. E quando este é abordado inundam-nos de lugares comuns e de muitas asneiras. Hoje não se acredita no sistema nem se acredita nas pessoas, porque o sistema, cá como lá fora, não responde às necessidades das populações e os políticos estão todos presos por rabos de palha, tão grande tem sido a promiscuidade quer interpartidária, quer intrapartidária. Ninguém está livre de ser acossado na praça pública, pelo que o exercício do poder se consagra, fundamentalmente, pela ausência de acção política.

Justificam-se assim actos de candidatura à revelia dos partidos, não porque só grasse a pouca vergonha nas personagens que se candidatam como independentes, mas principalmente porque estes conhecem os mensalões de todos os outros e perguntam-se: "sou só eu? Cadê os outros?"! E assim avançam. A lógica (?) que impera é a da classificação da pouca vergonha, ao estilo dos concursos de beleza; o importante é a comparação. Se alguém sabe de outrém, sendo que a única diferença é o conhecimento ou não público do facto, avança na lógica(?) do mal igual ou menor.
Bom exemplo temo-lo agora com as recentes declarações de um autarca ,afastado das listas do seu partido para a Câmara do Porto, que sem hesitações proferíu afirmações que incomodam e agitam as eleições na segunda cidade do País.
Muitos têm o rabo preso e todos eles são de mais para este desgraçado País, como fácilmente se constata pelo estado calamitoso a que a economia, a saúde, a educação, a velhice e a política chegou.

Prevejo umas eleições autárquicas muito difíceis para o PSD, com candidatos frouxos, outros desavindos, outros ainda divididos e uma liderança política fraca e sem chama. Marques Mendes fala pouco, diz pouco, sabe pouco e o pouco que diz onde impera a razão fá-lo sem convicção.
(nota: neste particular o Primeiro-Ministro não está melhor, diria mesmo que por inerência do cargo está bem pior. Pergunto-me: ainda estará de férias? Ninguém o sente, ninguém o ouve. Fossem estes outros tempos e o que já não tinha soado).

Prevejo de seguida umas presidenciais difíceis para o centro-direita a confirmar-se a candidatura de Cavaco Silva. A sua personalidade, postura e intervenção política enquanto primeiro-ministro está longe, muito longe de congregar o centro-direita. Dentro da massa anónima votante por norma PSD, conheço muitos que não votarão no Professor. E as razões são diversas.
O risco de Cavaco Silva perder para Soares existe e, se assim fôr, uma vez mais (após as eleições legislativas) a vitória não seria obtida por mérito do candidato vencedor, mas por demérito do vencido, apresentando-se a votação com contornos de castigo.

O País ficaria então ainda pior (se possível), porque se passaria a votar, claramente, pela negativa, pela penalização e não pela assumpção da existência de qualidades morais, políticas e humanas nos candidatos.
Em última instância este facto equivalerá a afirmar em definitivo que o sistema está fortemente viciado, empobrecido e carente de qualidade.
Os tempos seriam então, forçosamente, de mudança.
Para melhor espera-se, com o empenho de todos.

5.9.05

POEMA

Terrível é o homem em quem o senhor
desmaiou o olhar furtivo das searas
ou reclinou a cabeça
ou aquele disposto a virar decisivamente a esquina.
Não há conspiração de folhas que recolha
a sua despedida. Nem ombro para o seu ombro
quando caminha pela tarde acima.
A morte é a grande palavra para esse homem
não há outra que o diga a ele próprio.
É terrível ter o destino
da onda anónima morta na praia.

Ruy Belo

Valerie Fast Posted by Picasa

2.9.05

No fim da vaidade o começo da imbecilidade...

«Talvez que esse excesso de procura e consciencialização nos afastasse humanamente uns dos outros. Literatos num sentido polemizante, ficava-nos pouco tempo para reparar no semelhante que vivia ao lado. E eu espantava-me de não ser capaz de encontrar entre aqueles companheiros de inconformismo e de ilusão um amigo que me desse tanto gosto de ver de vez em quando como o Alvarenga. Bons camaradas quase todos, tinham, contudo, os defeitos das próprias virtudes. Intelectualizados da cabeça aos pés, mal tocavam a realidade. Eram platónicos no amor, teóricos no desporto, metafísicos no convívio. A convicção de serem únicos distanciava-os do vulgo, tornando-os incapazes dum contacto permanente com as forças rasteiras da natureza.»

Miguel Torga

Crónicas Dispersas de Outros Tantos Temas...

Mário Soares voltou. Cavaco Silva prepara-se para voltar, oficialmente, porque oficiosamente já aí está. Apetece dizer: -São sempre os mesmos, até doi!
José Pacheco Pereira diz, bem, que o problema de Soares não se deve colocar na idade mas ao nível das ideias. De facto não deverá funcionar a idade como um ferrete, um rótulo, capaz por si só de determinar com exactidão da maior ou menor capacidade intelectual de um qualquer indivíduo. Conheço muitos que muito mais novos são autênticos imbecis e outras que a provecta idade só se encontra mesmo no BI, mostrando uma imensa sabedoria e, mais importante, uma enorme capacidade de análise e discernimento. Não seja então a idade o elemento castrador das pretensões, sejam estas quais forem.
No plano das ideias, quanto a Mário Soares estamos falados. Já não serviam há vinte anos quando foi eleito pela primeira vez pelo que não se poderá esperar que sirvam agora.
Contudo a questão da idade tem, a despeito do que foi afirmado, que ser colocada por duas razões fundamentais: a) não se acredita que a abertura a novas ideias, a novos conceitos tenha sucedido em simultâneo com o passar dos anos, bastando atentar nos argumentos esgrimidos por quem defende a sua candidatura para se perceber que Soares é entendido como garante da política "dejá vu"; b) igualmente pela singularidade de se reconhecer que vinte anos passados não conseguiram trazer à tona dirigentes políticos ( ao menos um) que mereça ser escrutinado numa votação presidencial - isto mesmo reconheceu Monjardino na passada 4ª feira após o arranque oficial da candidatura de Mário Soares.
E chegamos ao caminho onde entronca o problema maior, provávelmente o único, porque passa esta 3ª República: tudo, mas mesmo tudo, gira à volta dos partidos e como os partidos ( as pessoas que activamente colaboram nos partidos) fizeram de tudo, mesmo o inimaginável, para reduzir a política a uma actividade pouco recomendável, nos últimos trinta anos todos os políticos forjados nos partidos são, por definição, pouco recomendáveis e nada credíveis aos olhos da população. Desta forma surge aos olhos de todos como solução mais do que lógica, a única possível mesmo, recorrer ao parque jurássico da política nacional para de lá arrancar uns candidatos a presidentes desta república partidocrática. Mesmo aqueles que presumam ter condições para desempenhar cabalmente o cargo de Presidente da República recuam perante a possibilidade de serem escrutinados, cientes que estão que estas eleições, como as demais, são totalmente dominadas pelos partidos e que os eleitores votam nestes com a mesma convicção com que são do clube A ou B desde pequeninos. O espírito crítico foi erradicado da sociedade portuguesa, por vontade política, em simultâneo com o crescimento da alienação alimentada pelas novelas e pelo futebol, também por igual vontade política. E depois, antes de 1974 é que eram famosos os três F´s. Deixem-me rir (mesmo que ao som do Jorge Palma, embora a solo seja mais redentor). Agora também temos um F, mas de lixados. Até nesse aspecto estamos mais pobres, só temos um F.
Os partidos são o centro, o epicentro, da vida nacional. Mas não podemos esquecer que acima de todos, dos homens e dos partidos, de toda e qualquer ideologia, está e estará sempre a PÁTRIA.
A questão não é, então, ideológica e não se discute ao nível das ideias. A questão é moral e discute-se ao nível da honestidade moral. Deseja-se ardentemente que a honestidade moral seja acompanhada de honestidade intelectual, para bem de todos, da Nação.
Quando colocado o problema no seu verdadeiro enquadramento estamos conversados quanto a moral e quanto a honestidade, seja ela qual fôr. Um laico que evoca Jesus Cristo no seu discurso (mesmo que citando Pessoa, embora fora do contexto) já nos disse tudo. Esqueçam o resto: está tudo verdadeiramente dito!

Voltamos então à questão das ideias: sem moral as ideias são perigosas, sejam estas quais forem!

Há um ano e meio o PS, na oposição, atacava fortemente o governo PSD em matéria de prevenção de fogos. Há um ano, o PS pretendia assar o governo nas chamas que consumiam Portugal. Em Maio deste ano o PS, já governo, anunciava com pompa a criação de um gabinete de prevenção e combate a incêndios. Meses depois, com o País quase por inteiro ardido, o PS vem anunciar a decisão de comprar em 2006 meios eficazes de combate aos incêndios - leia-se aviões capazes de transportar uns milhares largos de água de cada vez.

O Presidente da República afirmava, pouco tempo antes, que teriam de ser tomadas acções correctivas capazes de dotar o País dos meios necessários ao combate a incêndios por se encontrar o País perto do limite do sustentável. Perto do limite? O Sr. Presidente deveria fazer estas afirmações no local dos incêndios, perante assistências compostas por gente afectada pelas chamas, que tivessem perdido os seus haveres ou mesmo que tivessem sofrido apenas enormes sustos, para verificar da sustentabilidade da sua retórica. Ah, pois, fazem-me sinal que seria necessário que os presentes soubessem escutar e interpretar as palavras correctamente e não estivessem imbuídos, únicamente, da enorme vontade de aplaudir toda e qualquer asneira verbalizada pela ilustre figura do Presidente, pelo respeito que esta inspira mais do que pela personagem que desempenha no momento aquelas funções. (Será que este respeito ainda vem do tempo da outra Senhora? Se não vier, então as palmas são mesmo por falta de estudos, como diria o outro). Porque será o PR tão condescendente com o governo socialista? Resposta: os PR´s deixaram de se preocupar com essa utópica ideia de terem de parecer presidentes de todos os portugueses. Melhor assim, ficam clarificados os lados do campo e acabam as hipocrisias. Os futuros Presidentes sê-lo-ão dos respectivos partidos e seus militantes e simpatizantes e nada mais do que isso, pelo que me é possível afirmar agora convictamente e sem rebuço de espécie alguma que nunca em trinta anos de partidocracia tive um Presidente que considerasse meu.

De qualquer forma pergunto-me: onde pára a oposição? Nem uma palavra se ouve a Marques Mendes ou qualquer outro destacado elemento do PSD.

Levaram tanta pancada e agora nada ? Agora que podiam falar, cheios de razão, ficam calados? Estranho?, nem por isso. Os partidos, todos sem excepção, estão no limiar da credibilidade e com eles toda a partidocracia que cresceu e envolve a República. Tal como na Monarquia Constitucional e na 1ª República, a actual situação cheira a podre e ainda mais a esturro e não só por incidência directa do flagelo das chamas. Os partidos protegem-se na esperança de continuarem a aproveitar da belíssima situação de que gozam, distribuindo tachos e favores, partilhando os cargos e bens materiais sem preocupações com cores e programas políticos. Atingirem-se uns aos outros agora, num momento de enorme fraqueza seria ainda mais suicidário, pelo que a alternativa reside no silêncio formal e polítcamente assumido. O País definha, os despojos do moribundo são cada vez menos, mas enquanto se tenta uma inclusão no espaço ibérico como parente pobre de Espanha, vai-se engolindo ávidamente o pouco que sobra. Sim, porque não se pense que é a UE a salvaguarda de uma modificação política no País. Caso acontecesse a UE ainda nos agradecia o pretexto para mostrar claramente e sem equívocos qual a porta de saída.

O El País deu à estampa na passada segunda-feira um enorme artigo onde atacava Portugal, a sua política, os políticos, os últimos trinta anos e ainda o actual governo de forma virulenta. Todos sabemos que os espanhóis adoram dizer mal de nós. Chateia mas passa. O que custa verdadeiramente não é o ataque, a que nos habituámos ao longo dos anos: o que verdadeiramente custa é ser tudo verdade e isso não chateia, dói e, ainda por cima, não passa!

De Regresso...

Neil Faulkner