Não é fácil analisar factos sem conhecer todos os contornos.
A notícia de há dois dias sobre a onda de violência gerada por centenas de jovens na praia de Carcavelos foi demasiado nebulosa e de contornos indefinidos para que se perceba, com exactidão, o que se passou.
Num primeiro momento foram referidos desacatos provocados por dezenas de jovens, posteriormente falou-se numa centena e, finalmente, em cerca de quinhentos.
A análise, como se disse, não é fácil mas conjecturando um pouco talvez se consiga chegar perto da realidade: um grupo não identificado de algumas dezenas provocou desacatos, na forma tentada de assalto; gerou-se burburinho levando à crispação dos banhistas presentes (no raciocínio terá de se levar em conta que a praia de Carcavelos tem uma frequência muito heterogénea, mais nas raças e credos que na condição social); a divisão, pela discussão inicial, entre brancos e negros terá surgido e, aí, provávelmente as cinco centenas amotinadas.
Não creio que tenha sido algo muito diferente disto, conforme não acredito numa movimentação de 500 pessoas para um determinado local, com um determinado fim, resultando em 4 ou 5 feridos ligeiros e no furto de um fio de ouro. Não, se estivéssemos perante um movimento daquela proporção, teríamos certamente consequências muito mais nefastas.
O que aconteceu e foi bem escondido terá sido, porventura, o acender de um rastilho que rebentou, por ora, em polvora seca, mas que masnifestamente indicia situações de tensão e de confrontação racial que derivam da degradação das condições de vida, ao nível social, económico, financeiro e cultural da população portuguesa, seja ela branca ou negra.
Os problemas tendem a potenciar os dislates e estes as confrontações.
No dia seguinte, após uma noite onde os limites foram por alguns claramente ultrapassados, somos surpreendidos pela notícia que, uma vez mais uma praia portuguesa - Quarteira - tinha sido invadida por umas dúzias de jovens (uma vez mais os jovens deste País na berlinda) que saídos de uma "Rave" resolveram trasvazar os seus excessos "em cima" de quem se encontrava num momento de calma, real ou artificial, nas existências sofridas do quotidiano que vai marcando as famílias portuguesas.
Nada que espante se atentarmos na tradução para português de "Rave": desvario, delírio, excitação, frenesi, falar como um louco, rugir.
Nada que espante, então, no comportamento daqueles jovens saídos de uma "Rave".
A questão é, contudo, mais profunda: se no 1º caso relatado condiconado à análise efectuada, se tratam essencialmente de deserdados da vida, de gente que se sente incompreendida e sufocada numa sociedade onde lhes parece não existir mais um lugar que lhes caiba - sejam brancos ou negros - no segundo caso a situação é diferente; a mistura de deserdados com herdeiros (a expressão aparece aqui para dar maior força ao sentido do texto) - aqueles, os que têm condições económicas para ir passar férias ao Algarve e que chegada a noite, tendo os pais programas combinados, ficam por acção destes com os bolsos recheados (e não me chateies) de euros e sem destino controlado, competindo com os próprios pais no horário de chegada na madrugada seguinte. Os filhos consomem alcool e drogas (ecstasy e heroína); os adultos "flirtam" uns com os outros, misturando pouca vergonha com, bastas vezes, cocaína.
Os extremos tocam-se em sociedades degradadas!
O exemplo tem de vir de cima e não vem. Pelo contrário!
O que chega de cima é ostentação eivada de impreparação.
Quem está "em cima" hoje, tem tiques baixos.
Quem está em baixo não se revê nas classes dirigentes, não se revê nos exemplos e não distingue diferenças que consubstanciem vidas sociais e económicas tão díspares.
Portugal, económica e financeiramente ainda não bateu no fundo. Está quase mais ainda falta alguma coisa.
O regime, esse, já caíu de maduro. Já se afundou.
As próximas gerações estão a ser educadas por portugueses autistas, egoistas, perdulários, viciados e mal-formados.
A geração rasca está a dar origem a outra geração ainda mais rasca, sem valores, sem passado, sem património cultural, sem referências familiares (que a geração dos pais ainda tinha e deu no que deu).
O regime está entregue!
Que mudança nos espera?
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