19.10.09

A confusão entre liberalismos: o político e o económico

Há uma direita liberal e uma direita social.

A diferença é doutrinária. A direita liberal acredita nas pessoas como motor da economia; a direita social acredita na economia como ferramenta da criação e consolidação do bem-estar das populações.

Ser liberal não implica, por si só, ser de direita ou de esquerda, nem sequer conservador.

Depois, acresce que há uma separação clara entre liberalismo político e liberalismo económico.

Ainda hoje muitos confundem socialismo com um montão de definições que em nada se prendem com socialismo. Aquela que nos interessa baseia-se no conceito de que socialismo é toda a doutrina intervencionista, que parta da necessidade da existência de acção do Estado na economia para fomentar o desenvolvimento económico e o bem-estar (para citar apenas duas) o que mostra uma enorme confusão de conceitos, porquanto o intervencionismo económico dos poderes públicos, do Estado, surgiu precisamente como forma de colmatar deficiências do liberalismo sem cair no campo do socialismo. Por outras palavras, a direita social intervem na economia para evitar a esquerda socialista.

O perigo reside no intervencionismo político do Estado (não no económico), tal como brilhantemente Tocqueville escrevia: " ...à medida que as condições se tornam cada vez mais iguais num determinado povo, os indivíduos parecem mais pequenos e a sociedade cada vez maior. Aumenta a noção dos privilégios da sociedade enquanto se restringe a dos direitos dos indivíduos. O poder político aparece como mais inteligente e sabedor do que qualquer indivíduo, sendo então sua obrigação como seu direito, pegar na mão de cada cidadão e conduzi-lo".

O próprio preconiza a centralização e o intervencionismo como dois grandes meios que permitem a extensão do despotismo. Quanto ao intervencionismo, Tocqueville vê o seu ponto de partida no aparecimento da grande indústria:" ...o Estado é obrigado a intervir nas relações entre os grandes industriais e os pobres operários, portanto, nas relações sociais, domínio do qual estivera excluído; também deve intervir nas grandes obras públicas, cuja necessidade se faz sentir cada vez mais intensamente e tem um peso enorme na actividade económica do Estado".

Para ultrapassar este perigo recorre a uma noção nova: a solidariedade. Para si "...a ideia de que tanto o dever como o interesse dos homens é tornarem-se úteis aos seus semelhantes [...]uma vida política a cada porção de território, a fim de multiplicar até ao infinito as oportunidades dos cidadãos agirem em conjunto e lhes fazer sentir diariamente que dependem uns dos outros".

Segue-se a célebre fórmula: " As instituições comunais são para a liberdade o que as escolas primárias são para a ciência". É esta fundamentação que deve agitar a administração local.

Mas em nada do que foi escrito transparece a ideia de que deverá existir liberalismo económico. O risco reside no liberalismo político, até porque, e não creio que possa ser sequer refutada a afirmação, o liberalismo é a planta que nasce do individualismo primitivo. Exagerando poder-se-á até afirmar que um liberal é um anarquista que se desconhece e "cuida do nó da gravat" (Maurras) ou que o anarquista é o executivo liberal com o cabelo desgrenhado e aspecto descuidado.

Há contudo bases de suporte à ideia, não a deixando parecer tão exagerada assim: (1) anarquismo dos economistas, liquidador do estado; (2) anarquismo concreto dos radicais anticlericais e; (3) anarquismo filosófico do pai do egotismo.
Por demais evidente é a separação entre o liberalismo político e o liberalismo económico.
O segundo pode levar à intervenção estatal, enquanto o primeiro é garante das liberdades e de uma maior e mais correcta redistribuição dos rendimentos. A solidariedade é a pedra de toque que se exige à sociedade. O liberalismo político não implica liberalismo económico. O Estado não tem de se arrogar o direito de intervir na economia enquanto agente económico, mas tem de satisfazer dus premissas: (a) ser um regulador de facto e; (b) ser um interventor casual sempre que seja absolutamente necessário, ou seja, que esteja em causa a liberdade e respeito do valor solidariedade.



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