Actualmente, o tema decorrente passa pela discussão da economia, das economias dos diversos espaços geográficos e sociais, da força e fraqueza dessas economias e das respectivas moedas.
Considero pertinente, dentro do contexto actual, deixando para trás tanto revivalismos como estigmas, e assumindo uma postura forçosamente contrária a qualquer leitura ingénua-romanesca da revolução dos cravos, cravar uma lança do pensamento económico do antes 25 de Abril.
Penso que, desta forma, poderei contribuir para o clarificar de algumas nebulosas que se mantêm persistentes e, persistentemente, têm sido muletas de desculpas idiotas.
A política económica do estado-novo é duramente criticada pela atitude reservada, que sempre mostrou, em relação àquilo que se costuma designar por grandes investimentos estruturantes nacionais.
Costuma apontar-se-lhe provincianismo, na leitura dos fenómenos económicos. Também se lhe aponta ausência de motivação na vontade de modernizar o país. Enfim, o provincianismo no seu melhor.
Utiliza-se ainda, abusivamente, um pensamento - "orgulhosamente sós" - descontextualizando-o, quando o mesmo só faz sentido se inserido na negação, nunca escrita mas factual por omissão de resposta positiva , à pretensão portuguesa de entrar na CEE, no início da década de 60, por parte dos membros, à altura, desta comunidade (na mesma altura foi também negada a entrada à Grã-Bretanha, dando origem à chamada "crise da cadeira". Aliás, o propósito português de adesão fora eco da pretensão inglesa).
A questão que se levanta é, então, com propriedade, tentar saber se: (i) foi puro provincianismo, baseado na defesa que essa postura política significava para a segurança do regime, ou; (ii) tratava-se de uma política económica pensada a longo-prazo.
Se verificarmos o que aconteceu a Portugal, nos anos que se seguiram ao 25 de Abril, percebemos o esforço para imprimir ao país um cariz e uma impressão modernizante, dotando-o de vias de comunicação várias cobrindo todo o território, abrindo as fronteiras ao investimento estrangeiro, aderindo à CEE e a todas as suas evoluções e derivações e muitas outras, supostamente demonstrativas de um Portugal moderno e aberto.
Facilitou-se a vida às famílias liberalizando o crédito, ao mesmo tempo que se liberalizava totalmente a economia.
Voltemos atrás no tempo: um Portugal, supostamente fechado ao exterior, atrasado e atrófico nas vozes discordantes do regime, apresentava várias vantagens das quais destaco duas: contas públicas controladas e moeda forte.
A segunda era função da primeira.
Se por um lado o estado não gastava mais do que podia, igualmente a moeda forte era garantia primeira de um direito de consciência nacional; a consciência de que o país não era rico, conduzia à conclusão de que a população tampouco o era.
Sendo Portugal na altura (hoje ainda mais) dependente do exterior para bens essenciais, porque nunca se conseguíu produzir para a auto-suficiência, enfraquecer a moeda significaria, forçosamente, enfraquecer a carteira dos portugueses, diminuindo-lhes a pouca qualidade de vida.
Não havia abundância, mas também não existia pobreza extrema ou exclusão social sistémica.
Contudo, existiam planos de fomento. Foram executados os três primeiros, com êxito assinalável - bem demonstrado pela capacidade nacional de resistir à primeira crise petrolífera - tendo ficado por executar o quarto, o mais ambicioso.
Assinale-se assim o facto incontornável de termos uma política económica pensada, e mais importante, executada de acordo com as possibilidades nacionais, no que se poderia classificar comummente como "não dar o passo maior que a perna".
Tinha o país à altura uma indústria forte - metalúrgica, siderúrgica, naval e química - e uma agricultura que, muito embora insuficiente para as necessidades nacionais, contribuía para um aliviar da pressão sobre a Balança de Transacções Correntes, no orçamento de estado português.
Volvidos todos estes anos verificamos que, actualmente, não há controle sobre a despesa pública, a exclusão social existe, bem como a pobreza extrema, crescendo todos os anos e nada tendo a ver com a recente crise económica.
A insatisfação social é presença permanente e premente e o país não está, longe disso, entre os países modernizados da Europa (uma rede de auto-estradas e outras vias de circulação rápida não são sinais de modernidade, aparentando muito mais sinais de despesismo, porque não estão ligadas umbilicalmente a investimentos importantes na economia, esses sim capazes de ser realmente sedimentadores e relevantes estruturalmente).
Seguindo a linha de raciocínio, que nos conduz a conclusões sobre o estado das economias actualmente, verificamos que, a par de uma sofreguidão em aumentar a capacidade de produção, promovendo e incrementando o consumo obrigatório que satisfizesse a oferta, através de uma redução do custo de produção (leia-se deslocalização - mão-de-obra barata - e robótica - desemprego supostamente absorvido pelos serviços) e facilitismo de acesso ao crédito, as economias ( os políticos e os "opinion makers") esqueceram-se de uma verdade muito simples: não se encontravam, as economias, todas no mesmo degrau e, bastaria esta razão, para que as medidas aplicadas numa não pudessem ser generalizadas a todas as outras. Por outras palavras, a estádios económicos diferentes, correspondem medidas económicas de e para crescimento diferentes.
Não foi isto que se passou. Fez-se tábua rasa das diferenças, aplicou-se a fórmula em todas, por falta clara de pensamento político e económico e os problemas de uns passaram a ser os problemas de todos, agravados consoante as economias se apresentassem, congénitamente, mais débeis.
Não é então de estranhar o problema endémico que assola Portugal: utilizando medicação errada, a economia portuguesa, saída de uma crise política e económica profunda (1975-1982), piorou consistentemente, até um estado pré-comático, moribundo, que verificamos agora, na ausência de ideias, de discursos mobilizadores, quer do governo (cada vez pior na sua actuação e arrogância, insuportáveis e inaceitáveis em tempos muito difíceis) quer de uma oposição que parece siderada com os acontecimentos que se sucedem diáriamente.
Não será possível, ao nível da intelectualidade e da honestidade inerente, considerar que o alinhavar de umas ideias escritas, por melhor sustentadas que estejam, permitem retirar conclusões indiscutíveis (desse mal também padecemos, o das conclusões rápidas). Filosóficamente é impossível, porque a conclusão conduz, forçosamente à dúvida, mas deduções, termo de sentido mais suave, concerteza que serão.
Resta-me então deduzir, para o pós-25 abril:
(1) toda a política económica portuguesa foi um fiasco, estando o país a pagar claramente a factura;
(2) a promiscuidade entre a coisa pública e privada é aviltante;
(3) não tínhamos condições para sustentar a despesa futura, que o despesismo em obras públicas nos vários consulados políticos, forçou;
(4) nem fomos capazes de empreender investimentos que capitalizassem esses mega-investimentos.
Por outro lado, e de novo à luz do conhecimento actual, parece possível intuir que o estado-novo tinha:
(1) preocupações sociais, impedindo o crescimento da pobreza e a exclusão, através de políticas económicas que passavam pela educação (os seus custos), pela alimentação (contenção dos preços), pela saúde (João Semana) e pela habitação (habitação económica - HE), tudo através de olíticas económicas controladas;
(2) reconhecimento social das profissões (ser chefe-de-oficina ou funcionário do estado, para não falar dos bancos, dava estatuto);
(3) opção por um crescimento económico lento mas sustentado e planeado (assiste-se hoje ao descalabro das políticas de crescimento económico acelerado e não programado/pensado);
(4) defesa da indústria nacional e em geral de tudo o que significava "made in Portugal" (é claro, hoje, que são crescentes os movimentos de proteccionismo nas várias economias. Estes movimentos aproveitam as economias fortes e são fatais para as economias fracas, como a nossa).
Por isto e aquilo parece-me claro que, no plano nacional, estaríamos hoje melhor com uma política económica ao estilo estado-novo, do que a economia político-colonial da nossa elite partidária.
E nada disto tem a ver com liberdades, direitos e garantias.....ou terá tudo a ver.
1 comentário:
Na sequência de tudo o que tenho acompanhado,na leitura de pensamento e profundo conhecimento de economia,inteligência, e o verdadeiro conhecimento critico do da situação actual. Pergunto !O porquê de não se dar oportunidades,a quem não está viciado na trama da politica atual e não se experimentar caras novas?
Será que terão que ser sempre os mesmos?
(Cansa)
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