9.2.09

E Nacionalize-se a Banca....

Escreveu Bruno Proença, no Diário Económico, que a crise arrasou por completo a credibilidade dos economistas.
É absolutamente verdade (com excepção deste economista que anda há muito a alertar para o que veio e para o que aí ainda vem).
De facto, os economistas falharam na avaliação da crise, na importância que lhe deram e igualmente nas origens e impactos da mesma.
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As economias há muito que deixaram de crescer a taxas que justificassem os investimentos absurdos na capacidade de produção das empresas, bem como na necessidade da deslocalização dos meios de produção e consequente deslocalização de capitais.
Hoje assiste-se a um fraccionar brutal do sistema económico e, consequentemente, a uma ruptura total no sistema financeiro.
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Os exemplos enunciados no Diário Económico, como soluções preconizadas por Stiglitz (Prémio Nobel da Economia em 2001) e Krugman (prémio Nobel da Economia em 2008) são antagónicos.
O primeiro assevera que o estado norte-americano deverá deixar cair todas as instituições financeiras, para que tudo comece de novo e limpo, enquanto o segundo defende a nacionalização total da banca.
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Olhemos para Krugman. O seu pensamento desenvolve-se em volta de um conjunto de questões, a saber:
(1)Espaço - global e desagregação espacial
(2)Sectores - nomenclatura, nível de desagregação, grau de cobertura
(3)Tempo - período de análise
(4)Variável - produção, emprego, VAB, etc...
(5) Indicadores económicos
(6) Espaço e Sector Padrão - termo de comparação
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Todos eles deverão ser considerados como indicadores gerais e terão de ser complementares e não substitutos.
Na análise tradicional, todas as regiões são consideradas iguais. Mas as regiões distinguem-se entre si por múltiplas características, sendo que a mais importante é o grau de centralidade económica, ou por outras palavras, o potencial de mercado.
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Olhando para a geografia económica europeia, três questões-chave se levantam, no que diz respeito à especialização dos países:
(i) qual o grau de especialização dos respectivos países?
(ii) qual o grau de similitude entre estruturas produtivas de diferentes países?
(iii) quais as características das indústrias localizadas em cada um dos países?
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Os resultados apontam para que, em média, entre 1970 e 1983 tenha havido uma maior semelhança entre as estruturas produtivas dos vários países.
Após 1983 a situação inverteu-se.
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Por países, verifica-se que de 1970 a 1983, 10 países tornaram-se menos especializados, apresentando menor divergência face à UE.
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Entre 1983 e 1997, 13 países acentuaram a divergência face á UE (maior especialização), com excepção da Holanda e, que apesar disso, entre 1981 e 1997, 4 países tornaram-se menos especializados, a saber: França, R. Unido, Holanda e Portugal.
Estas tendências mantiveram-se quase inalteradas.
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Em relação a Portugal, especificamente entre 1983 e 1997, verificou-se um aumento da divergência da estrutura produtiva portuguesa face a todos os seus parceiros da UE.
Acresce que Portugal apresenta os valores mais baixos ao nível tecnológico e de economias de escala, o que implica uma forte especialização em indústrias de baixo nível tecnológico, com mão-de-obra pouco qualificada e pouco peso do trabalho "não-manual".
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Surge então a questão "centro-periferia", estando Portugal irremediavelmente na periferia.
Acresce que embora se verifique um aumento do peso de Portugal na indústria europeia, entre 1973 e 1997, o aumento é menor que o peso populacional, logo vivem todos piores (nós os portugueses).

Convém recordar, a propósito de periferias, as quatro características apntadas por Samir Amin (economista de linha marxista) que definem um país periférico:

(1) predominância de capitalismo agrário (nós este nem temos, o que nos torna num país periférico dos periféricos);

(2)Formação de uma classe burguesa dependente de capitais externos, especialmente no sector do comércio (temos disto em fartura)

(3)tendência para a burocratização (palavras para quê...)

(4) formas específicas mas incompletas de proletarização da força do trabalho (também temos...)


Somos assim um país periférico, quer pelas regras da geografia económica, quer pelas regras do marxismo não ortodoxo.

Coloca-se agora a questão: será que a localização de indústrias terá ligação com tipos particulares de países?
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Os indicadores apontam nesse sentido; indústrias de alta tecnologia tendem a localizar-se em países centrais; indústrias de baixa tecnologia em países de periferia (e isto explica muita coisa).
Verifica-se então que, com a liberalização do comércio, seria expectável uma maior concentração geográfica das indústrias, sendo que esta especialização se verificaria tanto ao nível dos países de centro como de periferia.
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Em Portugal, como sabemos, esta tendência não se verifica, pelo que só podemos intuir uma explicação, para a discrepância entre as razões do modelo e a nossa falha: incompetência governativa acumulada durante anos, para fazer funcionar o país, nas vertentes cultural, científica, formação, direitos, legislação, funcionamento da justiça, desburocratização, etc., etc., etc..
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Complexo? Não, nem por isso.
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Basta atentar nas causas actuais da crise, para se perceber que esta é uma crise que começa por ser económica - há quantos anos a Alemanha não cresce a 5% ao ano ou os EUA não crescem mais do que 2,5% ? - que alastra ao sector financeiro, por necessidades políticas, de política económica e industrial, por necessidades de consumo - veja-se o caso Islândia - e que rebenta no sector financeiro, por este andar a fazer omeletes (muitas omeletes) sem ovos. Quando a pirâmide invertida começa a esboroar-se, a economia colapsa.
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E o que tem tudo isto a ver com as teses antagónicas de Stiglitz e de Krugman?
TUDO!!!!
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Se a economia dos EUA se apresenta, como os números comprovam, com uma centralidade económica-geográfica muito superior à Europeia, definida nos termos citados, deixar cair a banca significa deixar cair esta centralidade, para reiniciar tudo de novo.
Para que os EUA recuperem depressa, recuperando todos nós com a devida déchalage, não podem em caso algum os americanos perder a vantagem decorrente de uma geografia económica forte.
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Por isso e por isto, Paul Krugman tem razão. Intervenção total na banca será fundamental.
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Por cá, na Europa, o mesmo se deverá passar, obrigatóriamente. Aliás, já deveria ter sido feito, por todos (os franceses, pelo seu presidente, quiseram-no fazer em Dezembro, mas a Comissão não deixou).

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