A cooperação europeia é benéfica para todos os europeus. Não se discute este princípio. Não se vislumbra, contudo, como será possível evitar a importância das economias nacionais enquanto mola real da atribuição e regulação dos recursos. Quando se estabelecem comparações, o Estado nacional é sempre a unidade primária de comparação, a nível económico, social e político.
- esta internacionalização da economia não é um facto novo - entre 1870 e 1914 a economia internacional foi responsável por um fluxo financeiro de longo prazo muito superior, caracterizando-se os movimentos actuais por fluxos de capitais de curto prazo, em sintonia com a rápida troca de informação e os avanços nas tecnologias de comunicação.A economia em 1870 era mais aberta e integrada que a economia actual;
- as empresas transnacionais são difíceis de encontrar. Encontram-se, sim, empresas nacionais com actividade internacional (multinacionais), focadas no investimento entre economias muito semelhantes, interventivas ao nível da produção, serviços e "outsourcing";
- a mobilidade do capital é pequena, procurando destinos norte-norte ou norte-sul quando as economias mostram pujança. Mas mesmo no segundo caso, não existe desvio de investimento para países terceiro mundistas e a concomitante criação de emprego.
- a economia não é global. Se fosse que sentido faria falar na Tríade (G3)
- assiste-se a um crescimento rápido da convergência de rendimentos entre as nações líderes, associado à sua desindustrialização, por contraponto com a rápida industrialização de economias em desenvolvimento (deslocalizações de investimento).
- o GATT e a OMC garantem a regulação do mercado.
- apesar de existirem elementos reguladores verifica-se a ausência de vontade política para limitar os estragos da actividade económica, quer a nível interno, quer a nível internacional.
Duas guerras mundiais, com dezenas de milhões de mortes e prejuízos incalculáveis, resultaram da ideia de que a prosperidade nacional implicava uma competição internacional feita através do vínculo a mercados exclusivos, menosprezando , assim, a necessidade de que o comércio se processe inserido num vasto e global sistema de trocas e de investimento.
Na razão directa do argumento avançado verificamos, neste momento, a expectativa com que os EUA acompanham a evolução das mudanças comportamentais dos "europeus", que os americanos consideravam estável e que verificam agora resultar numa instabilidade com que não contavam. Ao contrário do que supostamente algum argumentário político pretende fazer crer, para os EUA a instabilidade europeia não é uma boa notícia, pois em numerosas áreas económicas os EUA necessitam do apoio europeu, bem como lhes é extremamente vantajoso, no presente, um euro forte. Aliás, o falar-se num confronto entre euro e dólar e na possibilidade de aquele suplantar este, é o mesmo que afirmar que se pretende o confronto directo com a economia mais poderosa do mundo e com toda a zona de influencia directa do dólar e, ao fazê-lo, está a fazer-se a apologia da guerra económica.
Na concentracção dos esforços, a nível mundial, necessário para o equilíbrio que se desenhou nos parágrafos anteriores, só um salto para um modelo imperialista, muito estudado e referido na actualidade por polítólogos e sociólogos, ou a criação de um sistema mundial de controle unificado compreendendo toda a humanidade, poderia justificar uma única unidade política e económica, não europeia, americana ou asiática, mas efectivamente mundial. Qualquer sinal contrário resultará sempre em blocos oponíveis, mesmo que colaborantes em matérias específicas. Ora esse sistema já funciona na Europa, através da União Económica e Monetária e, mesmo esta, já representou um passo demasiado arriscado e de elevados custos para todo o espaço europeu. Digo e repito que a solução ideal para a Europa, como bloco, será uma Zona de Comércio Livre, abandonadas as ambições políticas supra-nacionais, pan-europeias e encarados os interesses e as necessidades reais de todos os europeus.
A questão pode colocar-se, igualmente, ao nível dos agentes económicos e financeiros internacionais (apátridas), para os quais as barreiras geográficas são irrelevantes mas que necessitam, obrigatóriamente, de lidar com agentes políticos, de os influenciar e convencer, e que esbarram na necessidade que estes têm de prestar contas a cada Estado nacional e, através do voto, à população. Igualmente para aqueles mais fácil será lidar com um órgão único, regido por disposições legais aplicáveis a todos os europeus, indiscriminadamente, tutelado por um conjunto restrito de países, que ter de negociar com estados nacionais mais expostos na sua actuação à opinião pública e à mensuração mais imediata dos resultados obtidos. raciocínio válido mesmo sabendo-se dos constrangimentos económicos actuais, impostos a cada Estado-Membro.
Também o poder militar pode ser apontado como necessitando de um controle supranacional, pela necessidade de investimentos avultados e protecção do espaço vital. Pode afirmar-se ao nível do equipamento nuclear, pelos elevados custos de desenvolvimento e produção, mas sendo a tendência dominante para o controle de armas de destruição massiva, o equipamento militar convencional continuará a ser a referência principal e este deverá permanecer sobre o controle estrito do Estado nacional, como garante da sua soberania.
Não nos podemos esquecer, contudo, que a Europa depositou largos anos nas mãos dos EUA a sua própria defesa, evitando gastos nesta área e desviando verbas dos orçamentos militares para os orçamentos da saúde, da educação e da solidariedade e, assim, beneficiando largamente do papel protector americano.
Para que uma federação subsista no tempo, necessário se torna encontrar laços de afinidade cultural e histórica e de afectividade entre os seus membros. Assim tem sido nos EUA e na Austrália. Atente-se, pela inversa, nos exemplos da Irlanda e da Polónia, cuja anexação e partilha não conduziram ao fim das identidades nacionais, conduzindo no caso irlandês, em particular, a manifestações violentíssimas.
Se a federação de estados europeus será o futuro ou não, se esse futuro conduzirá à perca das soberanias nacionais em assuntos vitais para os Estados, poderá haver quem discuta e, até, discorde do argumento. Mas de uma certeza deveremos fazer fé: não é possível criar uma cultura europeia comum nem tão pouco uma identidade europeia a partilhar.
Uma identidade europeia não suscita apoios populares, uma cultura europeia simplesmente não existe - não esquecer que não foi possível pegar em imagens de monumentos nacionais autênticos, para colocar nas notas de euro, por não ter existido consenso entre os membros da UEM de quais representavam verdadeiramente a cultura e o sentimento europeu, quais os mais emblemáticos. A Europa assemelha-se hoje a uma arena, onde se degladiam interesses, identidades e culturas. E, acima de tudo, poder.
Não existe lugar para uma nação europeia. Se a nação moderna é uma comunidade de princípios político-legais, também o é, em simultâneo, por uma herança cultural histórica. No aspecto interno, a nação constitui-se baseada num estatuto, tanto legal como social. É na existência de direitos e deveres exercidos em relação aos demais e estabelecidos em constituições formais que se expressa a vontade nacional. No aspecto externo, a nação deve ser autónoma e soberana, por forma a um correcto exercício de auto-governo como Estado soberano em relação a outros iguais. É igualmente territorial no seu carácter, onde a população se reconhece geográficamente num território que "lhes" pertence, razão pela qual Portugal com os seus quase 900 anos de coincidencia política e geográfica territorial não apresenta dissenções, ao contrário de Espanha, onde bascos e catalães pugnam por um reconhecimento territorial (político) diverso do centro político de Madrid.
Existem então razões políticas, culturais, históricas, sociais, organizativas, míticas, simbólicas, rituais e económicas para que os Estados mantenham a sua soberania, a sua individualidade. Existem igualmente razões culturais, históricas e económicas para que os Estados não possam ser considerados todos no mesmo patamar de crescimento e desenvolvimento, num mesmo período. Os estádios são diferentes, como diferente é a percepção do mundo e da vida em cada um de nós, partes fundamentais do todo num Estado não estratificado, como é a nação moderna.
"Como seria uma sociedade universal onde não existissem países, que não fosse nem francesa, nem inglesa,, nem alemã, nem espanhola, nem portuguesa, nem italiana, nem russa, nem turca, nem árabe, nem indiana, nem chinesa, nem americana, ou melhor, como seria o mundo se fosse estas sociedades todas em simultâneo?... Sob que preceitos e costumes comuns, sob que leis comuns se fundaria e funcionaria esta sociedade?" François René, Visconde de Chateaubriand, 1841.
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