23.3.05

A Questão da Evasão Fiscal,

não pode ser encarada sómente como atitude malévola do contribuinte para com a sociedade onde se encontra inserido. Claramente, a capacidade de cobrar impostos passa, no essencial, pela capacidade coerciva do estado para impor as regras fiscais e o seu cumprimento. Sem coerção não existe receita fiscal, pois não é possível confiar as receitas fiscais à boa vontade distributiva dos contribuintes. Contudo, é igualmente verdadeiro, que o contribuinte espera resultados visíveis das contribuições que efectua para o erário público.
Os resultados da aplicação dos dinheiros públicos são visíveis em duas vertentes:
  • investimento público;
  • despesa pública.

Estas estão ligadas transversalmente por rúbricas onde se inserem as verbas dispendidas com a educação, a saúde, dignidade na 3ª idade, assistência aos idosos, combate à miséria e exclusão social, entre várias outras. Mas são aquelas, as referidas, que mais tocam o cidadão contribuinte, que mais fácilmente são perceptíveis da qualidade de vida da sociedade onde está inserido, do nível de desenvolvimento económico (bem diferente de crescimento) que apresenta.

Quando o cidadão contribuinte verifica que: não existe um serviço nacional de saúde que a todos contemple, célere nas suas capacidades de apoio na doença; quando o sistema educativo não corresponde às necessidades do país, os livros são caros, o insucesso escolar elevado; quando o desemprego está sempre presente, em crescendo; os idosos são tratados sem respeito, pela mesma sociedade que lhes come a carne mas, reiteradamente, lhes rejeita os ossos; quando as pensões de reforma são tão pequenas que a dignidade se perde; quando a miséria e a exclusão social aumentam nas ruas. Dizia-se, o cidadão contribuinte perde a vontade de contribuir para um estado tão cego e desinteressado dos reais problemas da sociedade.

Pode afirmar-se: mas então é uma pescadinha de rabo na boca! Se as receitas fiscais - fruto da má performance económica do país e da fuga às obrigações fiscais - se mantiverem baixas não haverá como inverter o ciclo.

O argumento é falacioso! Primeiro, porque o cidadão percebe quando estão a ser tomadas medidas concretas no sentido de melhorar o funcionamento e operacionalidade do sistema num estado-providencia moderno. O contacto, permanente, que mantem com as instituições, permite-lhe aferir das mudanças em curso e do esforço desenvolvido. Também porque há sinais: quando o estado é o primeiro a dar sinais de contenção, a mostrar que distingue, claramente, o essencial do supérfluo, quando a política está orientada para o indivíduo enquanto elemento fundamental do agregado que designamos como sociedade. Quando a vontade colectiva emana do somatório das vontades e desejos individuais e não o seu contrário quando as vontades são impostas por um grupo de iluminados , fechados numa clique política, de acesso restrito, quer físico quer intelectual, mas que, em simultâneo se entregam a exercícios de franco mau gosto, nos modos, na actuação cívica e moral, no discurso político vazio de conteúdo.

O Estado somos todos nós. Ninguém, político profissional ou não, se pode arrogar o direito de corporizar o estado porque o estado resulta do somatório de todas as individualidades que o compõem, ou seja, todos nós!

Em segundo lugar porque o nível de receita fiscal não pode ser encarado como um dado estático - porque depende da performance económica - nem as taxas dos diferentes impostos deveriam ser rígidas, mas sim flexíveis e adaptáveis às condições económicas apresentadas por uma determinada sociedade, num determinado espaço de tempo. Se o rendimento diminui, a carga fiscal teria, obrigatóriamente, de diminuir também. Se as populações vêm os salários reais diminuir, como é possível continuarem a descontar impostos, baseados nos salários nominais, calculados através de tabelas imutáveis? O rendimento disponível das famílias será tendencialmente menor e, aqui, estaremos perante outra pescadinha de rabo na boca. As culpas estão repartidas, como se depreende. Mas cabe ao estado a maior quota de responsabilidade. É este que é responsável, através de políticas económicas e sociais de garantir o bom funcionamento das instituições e de assegurar os recursos necessários à sua função reguladora, social e distributiva.

Em países como o Canadá e os EUA, as taxas equivalentes aos nossos IRS e IRC mudam constantemente, no mesmo exercício fiscal, de acordo com os indicadores económicos.

Em Outubro de 2004, o IRS em Otawa já tinha sido alterado quatro vezes no mesmo exercício fiscal. Desconta-se de acordo com as necessidades do estado, mas igualmente de acordo com as bolsas dos contribuintes. E neste país, o acesso à saúde, educação e a dignidade na terceira idade não são uma miragem.

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