Quando no passado dia 20 de Fevereiro, os portugueses decidiram atribuir uma vitória clara ao PS, por maioria absoluta, decidiram-no na convicção de existirem no interior do partido soluções de militância política, em número e qualidade suficientes para constituirem um governo.
Conhecida a composição deste, verifica-se que metade do elenco governativo é "independente", palavra que parece guardar um novo sentido político. Na realidade ser independente significa não pertencer a qualquer agremiação política, não deter qualquer filiação, não viver e respirar a política, não fazer da discussão política e do comportamento político o meio de vida, o que deriva numa dúvida pertinente e a roçar a existencialidade: se os "independentes" são uma nova realidade ao nível governativo, qual o futuro papel dos partidos políticos?
Porque na realidade o voto é político, exara de um modelo de sociedade preconizado, de uma solicitação política temporáriamente ajustada, de opções mais liberais, ou mais sociais, ou mais comunitárias, enfim, de todo o ror de soluções do espectro político.
Ao verificarmos que a nomeação de metade do executivo recai sobre indivíduos sem vivência partidária, que não "respiram" política, duas questões serão pertinentes: i) o PS não tem nos seus quadros gente capaz de arrostar com a responsabilidade governativa, por incapacidade técnica e política ou; ii) o PS virou, de alguma forma, as costas à formação deste governo.
Provávelmente a resposta estará algures entre as duas questões. Défice de qualidade no PS (referido e explicado em "posts" anteriores), que parece inequívoca pela necessidade de recorrer sempre aos mesmos políticos e ex-governantes, sem que se sinta sangue novo no partido e, igualmente, dificuldade de formar governo contando com algumas das figuras gradas do Rato, o que poderia justificar o secretismo na formulação dos convites e formação do executivo (sem deixar de se aplaudir esta medida por outras razões).
De qualquer forma, a situação criada é extremamente desconfortável para todas as forças políticas, com particular destaque para o PS pela imagem de fragilidade que debita para o exterior. Até porque é importante lembrá-lo, o PS ganhou com maioria absoluta, sem necessidade, portanto, de agradar a gregos ou troianos e podendo, assim, formar um governo com figuras políticas do partido, dentro do espírito e da doutrina que advogam e no qual o País votou claramente.
Igualmente porque é mau entregar a coisa pública a tecnocratas. A política tem razão de ser e de existir. O pensamento político é antigo, a discussão política é profícua, a actuação política necessária. Aceita-se um ou dois elementos independentes, por manifesto conhecimento das pastas a tutelar e pela necessidade de introduzir competência técnica nalgumas matérias. Recusa-se o recurso em massa a independentes, por contrariar o sentido que se expressa quando se vota, por esvaziar de conteúdo a necessidade das formações políticas e por diminuir, na opinião pública, a importância da militancia política e a sua capacidade formativa ao nível das competências.
Um governo assim é um "tiro no pé" no PS e na credibilidade política. Mas poderá suceder que este seja um Primeiro Ministro a prazo, que o PS "sentado" na sua maioria absoluta venha, num futuro próximo a constituir um novo executivo, com uma nova liderança, sem necessidade para tal de eleições antecipadas, visto estar legitimado pela referida maioria. A situação actual é diametralmente oposta à do anterior executivo e poderá, quem sabe, passar por aí parte da explicação.
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