7.12.05

O Sistema Está Gasto...

A ruptura no sistema é inevitável. Mesmo decorrendo de forma parcimoniosa, suave, gradativa e tantas vezes quase imperceptível. Porque as revoluções podem vir a assumir contornos radicais sem que tenham brotado de processos revolucionários, no sentido dado por Kant.
Constituindo-se a política numa esfera de influência inteligível ao nível da moral é, por obrigação mais do que por definição, uma relação entre governantes e governados, entre quem tem a obrigação de dirigir e quem tem de se submeter às decisões.
É claro que num regime político democrático esta relação tácitamente aceite se baseia em princípios antigos, do bom e do mau governo (da boa ou da má moeda), da conquista do poder e da forma como ele é exercido, da separação entre o poder político e o poder judicial, de quais os poderes que lhes são atribuídos, como se distinguem e interagem, como surgem as leis e como se procede no sentido do seu cabal cumprimento.
Do indivíduo singular não se ouve falar em direitos, senão circunstancialmente, mas acima de tudo de deveres - obediência às leis, transparência fiscal, comportamento cívico e moral.
Esta será a leitura do ângulo dos governantes, mas é possível fazer idêntica leitura do ângulo dos governados. Quando deixamos de considerar estes como um grupo coeso, de princípios morais comuns, regidos pela face dos deveres, e os consideramos como o somatório de vontades individuais, olhadoa à face dos direitos, percebemos que estamos a falar da mesma moeda, mas também de uma inflexão no registo político aceite, de uma revolução radical nas ideias, dogmas e preceitos comummente aceites.
Quando, individualmente, cada cidadão dá como bom o princípio de que em termos políticos já não existem diferenças; quando a análise a candidaturas políticas individuais é feita com total indiferença pelas personalidades em confronto, na convicção de que são todas iguais; quando esta indiferença nasce da certeza que o poder da mudança não reside nas vontades políticas partidária ou pessoais; quando, finalmente, nos damos conta de que esta interiorização individual da potência política é o sentimento generalizado do colectivo, assistimos, em definitivo, a uma mudança na face da moeda, a uma concepção lockiana onde os direitos naturais são a resultante de uma concepção individualista da sociedade, da essênciaa do Estado e que este é e representa o colectivo.
E representa bem ou mal, com a diferença de que o colectivo, somatório das percepções individuais, agora se dá conta e exige explicações para a boa ou má governação.
Se os candidatos políticos, individualmente considerados, não conseguem transmitir qualquer sentido ou objectivo político à acção governativa, eles próprios, não intencionalmente, subscrevem a tese de que a política nada tem a acrescentar no formato actual e que, enquanto cidadãos individualizados, se debatem com o mesmo problema e dilema dos demais indivíduos - como aceitar (ou impor) tantos deveres, sem sentir (garantir) a existência de direitos.
O Sistema está gasto.

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