2.9.05

Crónicas Dispersas de Outros Tantos Temas...

Mário Soares voltou. Cavaco Silva prepara-se para voltar, oficialmente, porque oficiosamente já aí está. Apetece dizer: -São sempre os mesmos, até doi!
José Pacheco Pereira diz, bem, que o problema de Soares não se deve colocar na idade mas ao nível das ideias. De facto não deverá funcionar a idade como um ferrete, um rótulo, capaz por si só de determinar com exactidão da maior ou menor capacidade intelectual de um qualquer indivíduo. Conheço muitos que muito mais novos são autênticos imbecis e outras que a provecta idade só se encontra mesmo no BI, mostrando uma imensa sabedoria e, mais importante, uma enorme capacidade de análise e discernimento. Não seja então a idade o elemento castrador das pretensões, sejam estas quais forem.
No plano das ideias, quanto a Mário Soares estamos falados. Já não serviam há vinte anos quando foi eleito pela primeira vez pelo que não se poderá esperar que sirvam agora.
Contudo a questão da idade tem, a despeito do que foi afirmado, que ser colocada por duas razões fundamentais: a) não se acredita que a abertura a novas ideias, a novos conceitos tenha sucedido em simultâneo com o passar dos anos, bastando atentar nos argumentos esgrimidos por quem defende a sua candidatura para se perceber que Soares é entendido como garante da política "dejá vu"; b) igualmente pela singularidade de se reconhecer que vinte anos passados não conseguiram trazer à tona dirigentes políticos ( ao menos um) que mereça ser escrutinado numa votação presidencial - isto mesmo reconheceu Monjardino na passada 4ª feira após o arranque oficial da candidatura de Mário Soares.
E chegamos ao caminho onde entronca o problema maior, provávelmente o único, porque passa esta 3ª República: tudo, mas mesmo tudo, gira à volta dos partidos e como os partidos ( as pessoas que activamente colaboram nos partidos) fizeram de tudo, mesmo o inimaginável, para reduzir a política a uma actividade pouco recomendável, nos últimos trinta anos todos os políticos forjados nos partidos são, por definição, pouco recomendáveis e nada credíveis aos olhos da população. Desta forma surge aos olhos de todos como solução mais do que lógica, a única possível mesmo, recorrer ao parque jurássico da política nacional para de lá arrancar uns candidatos a presidentes desta república partidocrática. Mesmo aqueles que presumam ter condições para desempenhar cabalmente o cargo de Presidente da República recuam perante a possibilidade de serem escrutinados, cientes que estão que estas eleições, como as demais, são totalmente dominadas pelos partidos e que os eleitores votam nestes com a mesma convicção com que são do clube A ou B desde pequeninos. O espírito crítico foi erradicado da sociedade portuguesa, por vontade política, em simultâneo com o crescimento da alienação alimentada pelas novelas e pelo futebol, também por igual vontade política. E depois, antes de 1974 é que eram famosos os três F´s. Deixem-me rir (mesmo que ao som do Jorge Palma, embora a solo seja mais redentor). Agora também temos um F, mas de lixados. Até nesse aspecto estamos mais pobres, só temos um F.
Os partidos são o centro, o epicentro, da vida nacional. Mas não podemos esquecer que acima de todos, dos homens e dos partidos, de toda e qualquer ideologia, está e estará sempre a PÁTRIA.
A questão não é, então, ideológica e não se discute ao nível das ideias. A questão é moral e discute-se ao nível da honestidade moral. Deseja-se ardentemente que a honestidade moral seja acompanhada de honestidade intelectual, para bem de todos, da Nação.
Quando colocado o problema no seu verdadeiro enquadramento estamos conversados quanto a moral e quanto a honestidade, seja ela qual fôr. Um laico que evoca Jesus Cristo no seu discurso (mesmo que citando Pessoa, embora fora do contexto) já nos disse tudo. Esqueçam o resto: está tudo verdadeiramente dito!

Voltamos então à questão das ideias: sem moral as ideias são perigosas, sejam estas quais forem!

Há um ano e meio o PS, na oposição, atacava fortemente o governo PSD em matéria de prevenção de fogos. Há um ano, o PS pretendia assar o governo nas chamas que consumiam Portugal. Em Maio deste ano o PS, já governo, anunciava com pompa a criação de um gabinete de prevenção e combate a incêndios. Meses depois, com o País quase por inteiro ardido, o PS vem anunciar a decisão de comprar em 2006 meios eficazes de combate aos incêndios - leia-se aviões capazes de transportar uns milhares largos de água de cada vez.

O Presidente da República afirmava, pouco tempo antes, que teriam de ser tomadas acções correctivas capazes de dotar o País dos meios necessários ao combate a incêndios por se encontrar o País perto do limite do sustentável. Perto do limite? O Sr. Presidente deveria fazer estas afirmações no local dos incêndios, perante assistências compostas por gente afectada pelas chamas, que tivessem perdido os seus haveres ou mesmo que tivessem sofrido apenas enormes sustos, para verificar da sustentabilidade da sua retórica. Ah, pois, fazem-me sinal que seria necessário que os presentes soubessem escutar e interpretar as palavras correctamente e não estivessem imbuídos, únicamente, da enorme vontade de aplaudir toda e qualquer asneira verbalizada pela ilustre figura do Presidente, pelo respeito que esta inspira mais do que pela personagem que desempenha no momento aquelas funções. (Será que este respeito ainda vem do tempo da outra Senhora? Se não vier, então as palmas são mesmo por falta de estudos, como diria o outro). Porque será o PR tão condescendente com o governo socialista? Resposta: os PR´s deixaram de se preocupar com essa utópica ideia de terem de parecer presidentes de todos os portugueses. Melhor assim, ficam clarificados os lados do campo e acabam as hipocrisias. Os futuros Presidentes sê-lo-ão dos respectivos partidos e seus militantes e simpatizantes e nada mais do que isso, pelo que me é possível afirmar agora convictamente e sem rebuço de espécie alguma que nunca em trinta anos de partidocracia tive um Presidente que considerasse meu.

De qualquer forma pergunto-me: onde pára a oposição? Nem uma palavra se ouve a Marques Mendes ou qualquer outro destacado elemento do PSD.

Levaram tanta pancada e agora nada ? Agora que podiam falar, cheios de razão, ficam calados? Estranho?, nem por isso. Os partidos, todos sem excepção, estão no limiar da credibilidade e com eles toda a partidocracia que cresceu e envolve a República. Tal como na Monarquia Constitucional e na 1ª República, a actual situação cheira a podre e ainda mais a esturro e não só por incidência directa do flagelo das chamas. Os partidos protegem-se na esperança de continuarem a aproveitar da belíssima situação de que gozam, distribuindo tachos e favores, partilhando os cargos e bens materiais sem preocupações com cores e programas políticos. Atingirem-se uns aos outros agora, num momento de enorme fraqueza seria ainda mais suicidário, pelo que a alternativa reside no silêncio formal e polítcamente assumido. O País definha, os despojos do moribundo são cada vez menos, mas enquanto se tenta uma inclusão no espaço ibérico como parente pobre de Espanha, vai-se engolindo ávidamente o pouco que sobra. Sim, porque não se pense que é a UE a salvaguarda de uma modificação política no País. Caso acontecesse a UE ainda nos agradecia o pretexto para mostrar claramente e sem equívocos qual a porta de saída.

O El País deu à estampa na passada segunda-feira um enorme artigo onde atacava Portugal, a sua política, os políticos, os últimos trinta anos e ainda o actual governo de forma virulenta. Todos sabemos que os espanhóis adoram dizer mal de nós. Chateia mas passa. O que custa verdadeiramente não é o ataque, a que nos habituámos ao longo dos anos: o que verdadeiramente custa é ser tudo verdade e isso não chateia, dói e, ainda por cima, não passa!

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