Se eu pudesse havia de... de...
transformar as palavras em clava!
havia de escrever rijamente.
Cada palavra seca, irressonante!
Sem música, como um gesto,
uma pancada brusca e sóbria.
Para quê,
mas para quê todo o artifício
da composição sintáctica e métrica,
este arredondado linguístico?
Gostava de atirar palavras.
Rápidas, secas e bárbaras: pedradas!
Sentidos próprios em tudo.
Amo? Amo ou não amo!
Vejo, admiro, desejo?
Ou não... ou sim.
E, como isto, continuando...
E gostava,
para as infinitamente delicadas coisas do espírito
(quais? mas quais?)
em oposição com a braveza
do jogo da pedrada,
da pontaria às coisas certas e negadas,
gostava...
de escrever com um fio de água!
um fio que nada traçasse...
fino e sem cor... medroso...
Ó infinitamente delicadas coisas do espírito...
Amor que se não tem,
desejo dispersivo,
sofrimento indefinido,
ideia incontornada,
apreços, gostos fugitivos...
Ai, o fio da água,
o próprio fio da água poderia
sobre vós passar, transparentemente...
ou seguir-vos, humilde e tranquilo?
(Irene Lisboa)
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